COLDPLAY BRASiL

Desculpe o transtorno, preciso falar do rock

Toda vez que Coldplay é indicado ou vence alguma categoria de uma premiação onde esteja rotulado como rock, acontece a mesma coisa. Uma chuva de comentários – muitos deles já partindo para um discurso de ódio – surge dizendo “Coldplay não é rock há muito tempo!”, “Rock é usar roupa de palhaço e cantar ‘Para-para-paradise’?”, “Coldplay não é mais Coldplay!”. Quando se administra um portal, é necessário conviver com esse tipo de coisa, mas chega uma hora em que se fica saturado de ler isso sempre.

Bem que sempre falam que ler comentários (principalmente no Facebook, onde as pessoas quase sempre saem falando antes de clicar no link e ler a notícia) é prejudicial à cabeça. Você já parou, alguma vez, para ler os comentários do G1, ou de qualquer outro portal – principalmente quando o assunto é política?

Eu virei fã de Coldplay em uma época onde gostar de Paradise era sinônimo de ser poser e os fãs que surgiram por conta de Mylo Xyloto em considerados um mal. Durante muito tempo me deixei basear em opiniões de fãs de longa data que se demonstravam insatisfeitos – e de saco cheio – dos rumos que a banda estava tomando. Fui ignorante comigo mesmo ao levar dois anos para reconhecer a magnificência daquele álbum – e como ele salvou a minha vida.

Apontar que uma banda não pertence a um gênero é fácil. Pesquisar sobre os estilos que o compõem e sua história também é – mas ser ignorante é bem mais excitante.

Basta dar uma simples pesquisada para ver que o rock, diferente do que muitas pessoas pensam, não é subir numa mesa e destruí-la, ou que é veementemente necessário que haja muita guitarra em uma música e ombros fora do lugar de tanto cravar a baqueta na bateria. Muito pelo contrário. O ritmo tinha, no início de sua história, o saxofone como instrumento principal.

O rock surgiu e se firmou no sul dos Estados Unidos nos anos 50 e rapidamente se espalhou pelo mundo todo, resultando em um tipo de música classificado como “rápido, dançável e pegajoso”, sendo facilmente caracterizado como eclético, por basear-se, principalmente no seu começo, no blues, no country e no jazz.

Claro, não se pode negar que a sonoridade do Coldplay mudou muito, mas não foi coisa de Viva La Vida para Mylo Xyloto, por exemplo. Foi uma evolução constante que foi surgindo a cada álbum novo. De Parachutes a A Rush Of Blood To The Head – de longe, os dois favoritos, principalmente dos fãs que defendem a teoria do “Coldpop” -, já foi uma mudança extremamente brusca: o violão melódico do primeiro lançamento deu lugar às guitarras rebeldes presentes no disco lançado em 2002. Em X&Y, vimos um Coldplay mais eletrônico, com uso de sintetizadores, o que foi deixado para trás em Viva La Vida, que usou e abusou de diversos instrumentos (entre eles, o violino). Esse estilo permaneceu em Mylo Xyloto – onde a banda também voltou a usar dos sintetizadores e inspirou-se na música pop -, em Ghost Stories, podemos voltar, um pouco, à epoca de Parachutes, por suas letras e versos sussurrados ao microfone, e em A Head Full Of Dreams, uma “música em technicolor”, como nas próprias palavras de Chris Martin:

“Nós queríamos fazer um álbum colorido. Fazendo todas as coisas que amamos, colocando juntas todas nossas ideias de música. E eu acho que isso realmente aconteceu. Não faz sentido para nós fazer outra Clocks, ou outro Parachutes. Nós somos muito curiosos agora, não somos os mesmos dos anos 2000. Todo álbum é um último, nada novo no horizonte. Nosso futuro? Show em tudo quanto é canto, sendo grandes músicos, criando música boa”

Chris Martin ao jornal itliano La Repubblica, em 2015.

Fato é que, no início dos anos 2000, o rock começou a perder grande parte de seu espaço para o pop. Porém, uma nova vertente do estilo, que relaciona o rock com a diversidade da música, surgiu criando elementos cruciais para as bandas de rock do século XXI: a aceitação da heterogeneidade e a exaltação de toda a história do rock.

Não há problema nenhum em identificar a mudança sonora da banda, em escolher seu álbum favorito, ou dizer que outro não é de seu gosto. O problema está em como isso é feito: a liberdade de expressão termina onde começa o discurso de ódio e, apesar do assunto ser música, é algo que se pode usar para a vida toda — e que só lhe torna uma pessoa melhor.

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